sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Opinião - João Ruivo


Convém reconhecer que, em Portugal, existe uma escassez de estudos sobre os formadores que investem o seu saber e o seu saber-fazer na formação de professores e de educadores. Ou seja: há uma grave lacuna na investigação sobre a formação dos sujeitos que inspiram modelos de actuação pedagógica, e condicionam as expectativas, as representações, as imagens, as atitudes e os comportamentos dos que querem ingressar na carreira docente.
A explicação mais fácil para justificar esta carência de referências, é de que são os próprios formadores que conduzem, sugerem e produzem os projectos de investigação sobre as experiências que levam a cabo, sobre as necessidades da formação, sobre o perfil dos formandos. Isto é: o objecto de estudo são sempre "os outros" e nunca aqueles que deveriam também ser actores e produto da investigação.
Não sabemos se vale a pena gastar muitas palavras sobre a urgência de alterar esta situação. De modificar um dos maiores estigmas que, hoje, condicionam a formação de professores e de educadores, e que resulta da sistemática insuspeita sobre a infalibilidade dos saberes, da hierárquica impunidade das opiniões, da suposta eficiência e actualização dos professores formadores, apenas... porque são eles que, científica e administrativamente, são os responsáveis pelos processos de formação.
Numa época que provoca e justifica a desactualização permanente, em que os dados provenientes da literatura e das práticas colocam a necessidade de pôr em causa, ou repensar, os modelos e os procedimentos de formação de professores, seria útil que, numa atitude de humildade profissional e coragem investigadora, os formadores começassem por interrogar o seu papel na modelagem percursos profissionais dos futuros docentes. Que indagassem a sua parte de responsabilidade na aparente ineficácia de algumas formações que se desejavam sólidas e prospectivas, numa clara compreensão de que a intenção era a de preparar docentes capazes de enfrentar os desafios do futuro e combater a erosão profissional.
Nos últimos anos tem-se vindo a assistir à introdução de perspectivas menos directivas, baseadas na investigação na acção, na cooperação entre formandos e formadores, na reflexão sobre e na acção. Mas também é legítima a dúvida sobre se existe, ou não, apenas um "modismo", um novo "linguajar pedagógico" que presumidamente alterou os discursos mas, no essencial, mantém posicionamentos, matrizes e actuações que em nada modificam a cultura profissional dos formadores, as expectativas dos formandos e a cultura organizacional das escolas.
Se a desculpa para a manutenção deste quadro resulta da suspeição de que o investigador dificilmente poderá ser sujeito e objecto da pesquisa, só estaremos a contribuir para sedimentar uma suspeita, bem mais grave, e que é a que resulta da (legítima?) desconfiança que recai sobre muitos processos e pressupostos formativos, acantonados nas mais dignas instituições formadoras.
A presunção da permanente inocência, omnisciência e clarividência dos formadores de professores induz à lenta morte, à insuportável agonia de todas as estratégias de formação, integradas no nosso sistema nacional de formação inicial e permanente de professores e de educadores
Não se trata de alterar, por alterar, mas sim de lançar um sereno desafio à reflexão sobre a eficiência (?) dos actuais modelos de formação inicial.
João Ruivo

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